‘Não quero ter 1 milhão de amigos no Facebook’

23/06/2013 00:33

Centrada como atriz e como pessoa, Giulia Gam mostrou nesta entrevista que está bem distante da vaidosa e falida Bárbara Ellen, sua hilária personagem em ‘Sangue Bom’. “Minha vaidade é mais pelo resultado do meu trabalho. Como mulher, sou vaidosa, sim, mas prefiro ser apenas adequada”, contou a atriz. Na conversa com a coluna, Giulia manifesta seu apoio aos protestos que se espalharam pelo Brasil na semana passada, diz que tem Facebook somente para saber como estão os colegas — “Não quero ter um milhão de amigos” —, fala de cirurgia plástica, de desafios na carreira de atriz e na criação do filho adolescente.

Tem muita atriz com complexo de Bárbara Ellen?

A esse ponto, eu não conheço. A Bárbara Ellen é uma ficção, uma caricatura. Deve ter um mercado de pessoas assim, principalmente na internet, onde tudo o que você faz ganha rapidamente uma dimensão muito grande. Pode ter gente que fica o tempo todo cultivando o fato de estar na mídia, mas isso não acontece apenas com atrizes. Pode ser uma socialite, por exemplo. Hoje em dia, ficou democrático.

Existe maior necessidade de aparecer hoje?

Acho que a novela discute um pouco isso. A forma como você lida com a imagem, as histórias que você cria a partir disso… Esse mundo virtual, que globaliza e junta as pessoas, acabou com os encontros reais, que passaram a existir naquele ambiente.

Você tem algum perfil em redes sociais?

Faço parte de uma das últimas profissões na qual é necessário estar totalmente desplugada para trabalhar. Tenho Facebook agora para manter contato com os amigos, porque ele substituiu um pouco o e-mail. Mas tenho poucos, não quero ter um milhão de amigos no Facebook. E hoje em dia, eu tomo conhecimento do que está acontecendo mais pelo que meus amigos postam, já que falta tempo até para ler o jornal. As passeatas são um bom exemplo do poder das redes sociais.

Qual é a sua opinião sobre as manifestações?

O descontentamento é grande. Indiretamente, sou filha da ditadura e a minha geração ficou num certo limbo. A gente teve o momento das Diretas Já, mas, no geral, não tinha muito o que fazer. Vejo que era um momento de passagem. Quando o Collor confiscou as poupanças, todo mundo ficou em casa sem ter o que fazer, no máximo ligando um para o outro. Teria sido diferente, talvez, se existissem essas redes sociais. Acho legal mostrar apartidariamente — deixando claro que o movimento continua sendo político — que isso é uma expressão de cidadania. A preocupação é não ter violência, confronto, e que isso não seja usado pelos partidos. A manifestação é civil.

Teve vontade de ir para as ruas participar?

Não fui porque não pude, mas fiquei impressionada. Muitos amigos meus foram, é um sinal de civilidade de um país que pode se expressar seja pelo que for. Quando isso não acontece, é porque estamos reféns. É claro que sempre há pessoas infiltradas para fazer baderna, para desqualificar o movimento. Mas a legitimidade da expressão é muito bacana. Nossos governantes eleitos publicamente têm que usar os serviços públicos. Claro que um presidente, um governador ou um prefeito tem que ter uma equipe de segurança porque eles estão no comando. Mas os filhos têm que estar numa escola pública, têm que usar o hospital público. Aposto que tudo estaria em ordem.

Você disse que sua profissão requer uma concentração, mas atores estão quase sempre diante de holofotes. É difícil administrar a passagem de uma coisa para outra?

A gente vai aprendendo. Minha personagem conta mentiras sobre mentiras para aparecer, quer estar na mídia a qualquer custo e isso é uma crítica a pessoas como ela. É como fazer plásticas no rosto e não saber mais qual é o limite. A gente sabe que a realidade do ator brasileiro é uma ralação, ninguém tem camarim com mordomo servindo champanhe. Não conheço nenhum ator de TV e teatro que tenha um jatinho (risos).

Como você lida com os paparazzi?

Acho que os paparazzi estão na função deles e existe demanda para isso. Quando você está lançando um filme, essa exposição faz parte do trabalho. É mais complicado quando você está numa situação delicada, alguma doença, separação, morte de alguém. Acho que tem que haver uma distância física mesmo, não invadir o seu espaço. Se não for uma coisa grosseira, a mim não incomoda.

Já pediu a um paparazzo para apagar alguma foto sua?

Isso não funciona, né (risos)? Já aconteceu ao contrário: um paparazzo ter a delicadeza de perguntar se podia fazer a foto e tal. Achei bacana. Uma vez, fui com a Carolina Ferraz a um festival de cinema e ela estava com uma pessoa que ainda não era namorado. Tinha um monte de gente em volta esperando que eles fizessem algum movimento que justificasse um namoro. Eu brinquei com ela: “Então, vou te dar o beijo para confundir tudo”. Ela se levantou, disse que não. Aí, inventaram que nós brigamos. Na verdade, eu queria era brincar com os paparazzi.

Sua carreira passou por muitas mudanças nos últimos tempos?

Olha, tem uma época em que você é jovem, e aí faz a mocinha e a heroína. E as mocinhas não tinham filhos, né? Esse era o folhetim bem folhetim mesmo, o clássico. Já uma atriz de 40 anos era a mulher fatal — algo que a Christiane Torloni e a Maitê Proença fizeram muito bem — mas esses bons personagens ficavam no cinema. Eu era nova e já me diziam assim: “Não faça papel de mãe porque depois você só vai fazer isso”. Hoje em dia, não tem mais isso. Vi uma cena da Carmen Verônica excepcional, antológica. Ela tem 80 anos!

As novelas mudaram?

Acho que sim, a gente já não tem aquele folhetim clássico. Uma das mudanças é essa aí de atrizes não tão jovens que hoje têm essas personagens incríveis na televisão. Adriana Esteves e Claudia Abreu, por exemplo. E tem a mudança na própria trama. O que fazer depois de ‘Avenida Brasil’? E ‘Cheias de Charme’, que subverteu a ordem, colocando as domésticas à frente? Foi uma mudança conquistada agora.

Não precisa entrar em crise de idade nem fazer plásticas, então?

A plástica tinha muito a ver com a preservação da beleza. No teatro é diferente, né? Você pode fazer uma velha e uma menina de 5 anos, o que importa é a sua energia, a intensidade. No cinema americano, uma ruga pode tirar o papel de uma atriz. Uma mulher muito bonita, que teve toda a carreira construída também na beleza, deve ter dificuldade para envelhecer. Não fiz nenhuma plástica e vejo hoje atrizes que você sabe a idade delas e vê que elas estão saudáveis, viçosas, com aspecto descansado. A flacidez da pele às vezes dá um aspecto cansado. Mas enganar a idade, não.

Então qual é o benefício da idade?

Posso fazer coisas com essa personagem que em outros tempos eu não conseguiria. Em ‘O Primo Basílio’ (minissérie de 1988), eu nem tinha casado. Como é que eu ia saber o que era traição? Tive um diretor, o Daniel Filho, mas eu não tinha técnica alguma. Emocionalmente, foi muito mais desgastante que hoje. Em relação à idade, tenho mais medo da questão de saúde, incapacidade motora (isso para o ator é muito cruel), a decadência que te impede de algo…

E o namoro com o americano Stephen Bocskay? Por que terminou?

Ficamos juntos por dois anos, ele estava fazendo uma pós-graduação aqui no Brasil, mas conseguiu um trabalho em Harvard. Achei importante, dei a maior força. A gente se fala, mas manter um relacionamento nesse momento em que ele está trabalhando lá e eu aqui, fazendo novela e sem tempo, fica difícil.

Como professor de cultura brasileira, ele via as novelas daqui?

Novelas, não. A gente se conheceu numa leitura de poesia. Gosto quando a pessoa não me conhece e não vem como uma imagem pré-concebida de mim. Foi o que aconteceu com a gente. Mas acho isso ótimo só quando não estou em trabalho. Porque sou uma pessoa vaidosa e posso dizer isso nessa altura da vida. Se apresento um trabalho e ninguém vem falar comigo, aí é um fracasso, né?

Está à procura de um novo amor?

Não. Nem dá tempo.

Você consegue sair quando está gravando?

Não. Nada, nada. Fico preocupada quando acaba a novela, porque vem aquele vácuo, aquele vazio. Agora, pelo menos, eu mantenho contato pelo Face. Antes, quando acabava a novela é que eu ia saber quem casou, quem teve filho, quem separou (risos).

Você se considera uma mãe moderna?

Nem sei mais o que é modernidade. Tento ser o mais honesta possível com os meus sentimentos para fazer com que meu filho (Theo, 16 anos) confie em mim e me respeite. Respeitar sem medo e confiar dentro de uma parceria. É difícil conseguir as duas coisas e não tem cartilha para criar filho.

Dá trabalho ser mãe de adolescente?

É através do filho que a gente vai lidando com a gente mesmo, é um espelho. Você é questionada o tempo todo, está a todo momento em xeque e tem que responder. Não dá tempo de consultar o Google. O filho é a ligação do passado — da tua relação com os teus pais — com o presente. Ele te ensina que a vida é maleável e, às vezes, foge do controle. O que supre tudo isso é o amor e o afeto.

O que você tem ouvido nas ruas sobre a Bárbara?

Eu queria ouvir mais, tenho saído muito pouco. O bacana é que as pessoas dão risadas. Minha preocupação era por conta das barbaridades que ela fala. Mas ela tem humor e acaba conquistando por esse lado engraçado. Ela provoca a mesma reação que as grandes divas, como Elizabeth Taylor e Rita Hayworth, provocam: um fascínio, um encantamento, mas, ao mesmo tempo, aquela vontade de descobrir algum podre daquela mulher. Me sinto como a Cruella Cruel (vilã dos ‘101 Dálmatas’), que causa medo nas crianças, mas elas adoram. E a novela inteira odeia ela! (risos)

O que você tem em comum com a Bárbara?

Ela é uma mulher que se produz, é a arma dela. Unha pintada, batom vermelho, cabelo, meias, perna, salto alto, tudo o que hipnotiza homens e mulheres, gays, trans, tudo! A minha vaidade não é essa, eu a gasto na própria Bárbara. Estou num momento em que nem pinto unha, às vezes tomo banho no próprio Projac. Preciso de alguns minutos sem Bárbara. Minha vaidade é mais pelo resultado do meu trabalho. Como mulher, sou vaidosa, sim, mas prefiro ser apenas adequada.

Fonte: https://migre.me/fg9Fz

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