As Fenícias discute a maternidade
Clássico grego de Eurípides é montado no Oficina, com elementos do teatro de rua
O mito grego de Jocasta, que se casa com o primogênito, Édipo, e vê seus filhos brigarem pelo poder inspirou um dos clássicos de Eurípides, As Fenícias, escrito em 411 a.C. O texto trata de assuntos atuais, como a disputa entre irmãos e a da tristeza em família. O diretor Caco Coelho, notando a contemporaneidade da peça, resolveu encená-la, mas com traços modernos.
Assim, a tragédia grega ganha contornos de teatro de rua com a presença de atores pendurados em tecidos suspensos no ar e engolidores de fogo. O espetáculo, que está no Teatro Oficina, encerra uma curta temporada neste fim de semana, em horários alternativos – hoje, à meia-noite; amanhã, às 18 e 21 horas; e domingo, às 18 horas.
Convidada por Coelho, Giulia Gam vive Jocasta pela segunda vez em sua carreira – a primeira foi na novela Mandala, exibida pela Globo em 1987, participação que a tornou conhecida nacionalmente. A nova experiência veio em um momento conturbado, pois a atriz disputa na Justiça com o ex-marido Pedro Bial a guarda do filho Theo.
Mesmo temendo não se concentrar o necessário para cumprir a temporada, Giulia armou-se de coragem e assumiu o papel. No primeiro semestre do ano passado, As Fenícias foi encenado por dois meses no pátio do Museu da República, no Rio de Janeiro, conseguindo elogios especialmente para o desempenho de Giulia. Ela divide a cena com dez jovens atores da companhia Circo de Estudos Dramáticos, dirigida por Caco Coelho.
O texto de Eurípides concentra-se na luta entre os irmãos Etéocles e Polinices, filhos de Jocasta. O apelo da mãe é pelo bom senso para que tanto a família quanto o Estado sejam poupados da tragédia. A peça começa justamente quando Édipo (interpretado por Edi Botelho, ator que também foi convidado), já conhecedor dos problemas na família, é preso em seu palácio pelos dois filhos, uma forma de materializar o sepultamento de um passado que não deverá ser lembrado.
A reação de Édipo é impressionante – tomado pelo ódio com a atitude dos filhos, ele faz uma previsão sombria, dizendo que Etéocles e Polinices disputarão o trono até a morte de ambos. A disputa, aliás, vai provocar a morte de Jocasta, que enterra uma espada no próprio peito. Ela resistira à notícia de que se casara com seu primogênito e, valente, continua a morar no palácio da família, na cidade de Tebas, junto dos quatro filhos que tivera com Édipo.
Por estar mais preocupada com a rivalidade entre os filhos que propriamente com o incesto de que foi vítima, Jocasta desperta uma discussão sobre a importância da maternidade, que é também a intenção do espetáculo montado por Caco Coelho. O diretor, aliás, foi obrigado a promover algumas modificações na montagem, por causa da diferença entre o espaço ocupado no Museu da República e o palco do Oficina.
Uma banda de percussão, que toca apenas instrumentos construídos a partir de sucata, é responsável pela trilha sonora, acompanhando a tragédia que marca a vida de Jocasta.
Fonte: Estado de São Paulo
Arquivo: Nuno Bragança