Luísa arrasou a atriz Giulia Gam

01/02/1989 19:46

“O Primo Basílio” deixou-a esgotada

Foi Luísa que consagrou a atriz Giulia Gam aos olhos do público. A crítica, os colegas e a TV Globo há muito que apostavam nela. Participou em O Primo Basílio no princípio dos seus 20 anos, mas desde muito menina, e apesar de não freqüentar o Teatro, queria ser atriz. Conseguiu. E já se dá ao luxo de recusar, trabalhos, para ficar a descansar.

Apesar dos 21 anos e da pouca aparição nos ecrãs brasileiros, Giulia Gam é uma estrela de primeira grandeza. Aprovada no grande teste de aceitação nacional – a tradicional novela das oito na TV Globo, – quando viveu, durante quinze episódios, a Jocasta da novela Mandala, a atriz ficou consagrada aos olhos dos brasileiros.

Regressou há pouco com a minissérie O Primo Basílio, onde interpreta, com talento incomum para quem não tem intimidade com as câmeras, as emoções da inexperiente Luísa. E entregou-se com tal intensidade que no fim esgotou... Neste momento, a atriz refugia-se em São Paulo, onde mora, estuda, namora, decora o seu novo apartamento e readquire energias.

Giulia estreou-se nos palcos há seis anos, sob a direção de Antunes Filho, com a peça Romeu e Julieta, no papel principal. Afinal, esta era a sua vocação desde menina, segundo confessa, embora, devido à sua pouca idade, não fosse ao Teatro. E achava “chatos” os espetáculos infantis a que podia assistir, diz. Mas gostava de ver mímicas e marionetes. Disposta a realizar o seu sonho quanto antes, fazia cursos paralelos: canto, flauta, violino e esgrima.

O Grupo de Teatro Macunaíma, dirigido por Antunes Filho, além de ter sido a sua grande escola, também a levou aos palcos de Los Angeles, Austrália, Alemanha, Espanha, Israel, Alemanha e França.

Comecei numa fase muito boa do grupo, refere Giulia, porque o Antunes fazia Teatro de repertório. Ensaiávamos quatro peças: “Romeu e Julieta”, “Quaderna”, “Macunaíma” e “Nelson Rodrigues”. Foi superinteressante, porque ensaiávamos essas quatro peças durante um ano e depois trabalhávamos três delas, uma por semana, alternando, durante o ano de 1984.

Nesse ano, ganhei o Prêmio Revelação com a minha Julieta. Foi um período muito importante, pela formação didática, de conhecimento, de cultura, de estudo, que o Antunes nos proporciona. Nas viagens ao estrangeiro, entrávamos em contato com grupos de Teatro europeus. Isso deu uma visão internacional chocante ao nosso grupo.

Ao invés de regressar ao Brasil com o grupo, Giulia ficou sozinha na França, onde integrou a equipe de Peter Brook, considerando que esse contato foi fundamental, porque conheci outras formas de trabalho. De volta, trabalhou com a produtora vídeo Olhar Eletrônico, onde fez alguns anúncios e se tornou conhecida dos paulistas.

Atuou também no Cinema, em O País dos Tenentes, Besame Mucho e Fogo e Paixão. Desligada de Antunes, fez Fedra, de Racine, ao lado de Fernanda Montenegro, com quem fez uma digressão pelo Brasil.

Com a Fernanda, conheci o lado brasileiro de se fazer Teatro. Entrei em crise, recorda a atriz. O Antunes faz um trabalho muito específico, o parâmetro dele é internacional. Portanto, eu não conhecia a produção nacional, não sabia como era a vida de um ator brasileiro.

Foi nessa fase da descoberta do seu país que Giulia recebeu o convite para fazer Jocasta. E o país descobriu-a. Luísa, por seu turno, consagrou-a em definitivo.

Senti que “O Primo Basílio” seria a minha escola de televisão. Estava insegura, porque era um trabalho difícil, com pouco tempo para estudar. Além do mais, a Luísa intrigava-me: era muito ambígua, cheia de subterfúgios e máscaras. Não foi fácil entendê-la. Tive de estudar a sua época, os costumes portugueses, a repressão em que vivia a mulher, realidades diferentes da minha.

Eu não compreendia porque é que ela não se defendia da Juliana, porque é que não abria o jogo com o Jorge, porque se matava de remorsos. As minhas personagens anteriores eram heroínas nobres, que lutavam e chegavam mesmo a morrer por uma causa.

A Luísa é frágil, impotente, imatura. Ela vai definhando e não consegue lutar. O Daniel (Filho, o realizador) sabia como me era difícil lidar com os sentimentos fragilizantes da Luísa, e preocupou-se em dar-me apoio psicológico, emocional.

Assim que terminou as filmagens de O Primo Basílio, a atriz recebeu novo convite para integrar o elenco de uma nova novela da TV Globo, mas recusou. Estava cansada. Voltou para casa, fez dieta, ginástica e massagens, para exorcizar a carga negativa de Luísa.

Impressionada com a técnica de representação de Marília Pêra (Juliana), Giulia interessa-se profundamente neste momento pela teoria teatral. Alugou um apartamento, onde mora sozinha, e não se preocupou em fazer planos.

Estou sem gás, confessa. Como sou capricorniana, entrego-me com muita intensidade, quase obsessivamente ao trabalho, sem ceder espaço à vida pessoal. Agora debato-me com esse problema: que tipo de vidas são uma e outra – se estão separadas ou não. Como me faltou fôlego, aproveito para rever amigos, criar laços afetivos, ler os meus livros, e... namorar.

Disposta a permanecer afastada durante uns tempos, só O Primo Basílio tiraria Giulia do seu refúgio: Nunca fui a Portugal. Adoraria poder ver de perto a reação dos portugueses ao nosso trabalho e estou à espera que o Daniel organize uma viagem. Se sair, vou lá.

Fonte: TV Guia

Arquivo: Nuno Bragança