Pelo amor do filho

24/08/2001 19:01

Giulia Gam conviveu durante alguns meses com uma dúvida cruel. "Não sabia se ia ou não ser bem recebida pelo público e pelos artistas." Mas em seu primeiro compromisso cultural desde que voltou de Nova York para lutar contra o jornalista Pedro Bial pela guarda do filho, Théo, de 3 anos, acabou com a incerteza. Nas ruas de Gramado (RS), onde foi participar do júri do 29 Festival de Cinema, fãs e colegas se motravam comovidos com seu drama.
A demonstração de carinho foi liderada pelo ator José de Abreu já na abertura do evento.  Ele anunciou a presença da atriz no corpo de jurado como "A mãe do Théo, Giulia Gam". "Me emocionei ao ser chamada como mãe do Théo e não como a atriz. Deu vontade de chorar", conta. O apoio estendeu-se aos fãs. "Você é linda e vai conseguir seu filho", disse uma turista catarinense. "Torço muito por você", incentivava a outra admiradora.
Toda essa receptividade e a nova decisão judicial tomada dia 1, que dá a Giulia o direito de ficar mais horas com o filho, estão sendo cruciais para a atriz. "Vou começar de novo, sim. Agora que sei que tenho esse apoio, estou me sentindo mais forte. Quando se leva o filho de uma mãe é pior que matá-la. Ela se sente frágil, fraca incapaz, mas está viva", desabafa.
O drama da mãe
"Minha história e a da Vera Fischer não têm nada a ver uma com a outra. Mas tem algo em comum, aquela bobagem de que mãe é mãe. Isso é dito pelos filhos! Em alguns momentos essa mãe pode até não estar bacana, mas quem vai julgar isso? A criança que é essa mãe. Mexer com maternidade é muito sério. O pai pode escolher ser pai ou não, já a mãe é mãe, o filho é filho. Ele pode nunca mais querer ver a mãe quando crescer, mas no começo a criança não tem julgamento nenhum. Ele quer é essa mãe. Da mesma forma, não existe uma mãe que não dê a vida pelo filho. Quando a mãe tem o filho arrancado de seu colo, a dor é tão profunda que a morte lhe parece a única saída de tão forte que é o sofrimento."
"Não tenho nada contra a depressão pós-parto, mas não tive um laudo médico dizendo isso. Se fosse, não teria nenhum problema em assumir, mas é bom frisar que o ato de ter filho não é simplório. Agora que está cainddo esse mito da maternidade cor-de-rosa, com as pessoas assumindo o lado carnal e sofrido que é o parto, é que se percebe que morte é morrer, nascer é nascer. Não é água com açúcar, é sangue e dor."
"Dá um alívio saber que posso ficar um pouco mais com o meu filho, participar um pouco mais do crescimento dele e não ser monitorada. Mesmo que não seja o ideal, me alegra. Eu não quero guerra com o Bial."
O fantasma  da solidão
"Desde os 15 anos não tive mais Natal, festa de fim de ano ou fim de semana. Estava sempre atuando, trabalhando, estudando. Também sou filha única, não tenho irmãos, minha família é pequena, cada um mora em um canto. Agora que estava fazendo um núcleo, perco tudo."
"Nova York me ensinou que nós no Brasil, temos uma família muito apaixonada, ligada. Nos Estados Unidos ou na Europa tudo é muito frio. Estou aprendendo a fazer como eles, a esquecer esse ideal da família bonitinha, cor-de-rosa, e ver que só são pessoas com o mesmo sangue e sobrenome. Morar em Nova York me ajudou a me redescobrir."
"Sempre fui sozinha. Aos 15 anos, trabalhava vinte hora por dia com o grupo do Antunes Filho. De repente, o grupo se rompeu. Foi muito forte, me senti abandonada. Não tinha para ondde voltar. Depois, com a morte do meu pai, quando fazia Fera Ferida, percebi que, por mais que fosse reconhecida em todo o Brasil, era abstrato, porque meu grande fã era meu pai. A primeira morte que enfrentei foi a dele: sabia que, junto, morria parte da minha história, do meu sangue. A partir desse momento, começou uma cobrança minha para formar uma nova família. Foi quando me casei."
"Fui feliz, engravidei e tive meu filho. Mas espero que esta fase de solidão passe também. Eu investi no casamento, na família, e quando você perde essa cumplicidade é complicado. Sem meu filho não dá para me sentir completa ou feliz."

A carreira por um fio
"Parei de atuar com o nascimento de meu filho, porque tive um contato muito real com o mundo. Como não era de uma companhia mambembe, em que todo mundo fica com os filhos para lá e para cá, e não via possibilidade de deixá-lo para trabalhar, abandonei o trabalho."
"Lembro que, diante de meu filho que chorava e dependia de mim para se alimentar, a obrigação de passar pancake ou botar peruca perdeu o sentido. Era como se não acreditasse mais naquilo. Por alguns momentos pensei que não conseguiria voltar a interpretar.
A dura volta à Globo
"Fiquei muito feliz com esse interesse da Globo. Achava que por estar com 34 anos e fora do batente desde 1998 não tinha mais lugar para mim. É que tem tanta gente nova na TV..."
"Comemorei ao saber que estão pensando em mim para a novela Um Lugar ao Sol. É muito bom quando trabalhamos com amigos como o Fábio Assunção. Conheci o Fábio bem novinha, quando fiz uma participação em Vamp. Até brinquei com ele que 'agora vou parecer a tia velha e não a mocinha'. Não posso falar isso senão não me chamam mais (risos)."
Perda, dor e morte
"Quando meu pai morreu, fui pega de surpresa. Mas senti mais a falta do meu pai quando o Théo nasceu. Tudo que queria na vida era mostrá-lo para ele. Quando começamos a perder as pessoas e ver que estamos virando os mais velhos da família, é duro. A morte é cruel, tenho medo. Mas a dor de não estar por perto é a que mais me machuca."
"Você se junta carnalmente e gera uma pessoa que une a sua história à de seu parceiro. É uma responsabilidade divina. Estava num momento muito privilegiado como atriz, entrando para campos de direção e produção, tinha um relacionamento estável, uma vida financeira bacana. Perguntava a Deus por que, num momento tão frágil e forte ao mesmo tempo que é parir uma criança, acontecem provações tão difíceis. Eu sofrer sozinha tudo bem. Mas uma criança não tem nada a ver com isso. Pedia para Deus me iluminar e dar força para o Théo, que nasceu um guerreiro."
"Quero que ele passe ileso por tudo isso, que sempre saiba que é muito amado. É uma pessoa especial."
Fonte: Revista Contigo!

Arquivo: Bia*