Saiba mais sobre "Dilúvio em Tempos de Seca"

25/02/2005 17:32

Um homem e uma mulher. Ele, um escritor, e ela, uma modelo. Ambos se encontram presos no diminuto banheiro de uma casa enquanto lá fora, entre raios e trovões, chove torrencialmente por intermináveis dias. A situação entre os dois sugere um clima apocalíptico, absurdo, marcado muito mais pelos desencontros do casal, pela solidão de cada um, do que pela provável relação de proximidade vivida por eles. Este é o universo, caótico, da peça teatral “Dilúvio em Tempos de Seca”, de Marcelo Pedreira, dirigida por Aderbal Freire-Filho e com os atores Giulia Gam e Wagner Moura. Esta peça, que já esteve por dois meses em cartaz no Rio de Janeiro, foi escrita em 2002 e apresentada pela primeira vez, na mesma ocasião, num dos ciclos de leituras dramáticas realizados no SESC Copacabana. Ciclos, cujo objetivo, não é apenas revelar novos autores, mas também mostrar os caminhos, igualmente novos, da dramaturgia brasileira.

É muito difícil determinar em que medida esta peça, “Dilúvio em Tempos de Seca”, se limita a contar linearmente a história do convívio de um casal, ou, num outro extremo, e de uma maneira mais ampla e universal, retratar visceralmente aspectos contemporâneos das relações humanas. Isso porque, ainda que a narrativa traga os índices de que um dos personagens é um escritor que promete fazer da modelo a sua musa, a trama é conduzida por raros momentos de diálogo entre eles, pois, o que predomina, são dois longos monólogos, nos quais, cada um desfia suas singulares visões de mundo, do mundo, e do próprio ser humano, sejam elas boas ou más. Agem como se fossem, aqueles dois, os últimos habitantes da terra, sem perspectivas, sem saída, presos pela chuva diluviana e, simultaneamente, enclausurados num lugar habitualmente caracterizado pela privacidade.

A relação entre esses dois personagens reflete, de certa maneira, esse tempo em que vivemos, quando a fronteira entre o espaço público e privado se torna a cada dia mais imperceptível. Não à toa, é uma dramaturgia que reflete, também, uma certa obsessão dos personagens pelo presente, expresso numa ausência de planos e objetivos definidos. A peça não trata, entretanto, essas questões de forma crítica e negativa e sim como algo intrínseco à contemporaneidade. Por essa razão, e paradoxalmente por causa da tonalidade apocalíptica da narrativa, o casal não parece estranhar e nem se assustar com o fato de estarem presos. Ambos agem normalmente, repetindo sempre os seus fazeres, e girando em torno de si mesmos ininterruptamente.

Mas, ao contrário do que a peça sugere desde seu início, uma saída é apontada ao final do espetáculo. A chuva cessa e uma luz solar irradia sobre aquele opressivo ambiente. Esta luz permite que os dois personagens abandonem sua clausura e se dirijam para as ruas. Pode ser o sinal de uma esperança, ou não, até, provavelmente, a próxima tempestade.

Dilúvio em Tempos de Seca
Texto: Marcelo Pedreira.
Direção: Aderbal Freire-Filho.
Elenco: Giulia Gam e Wagner Moura.
Local: Teatro SESC Anchieta.
Endereço: Rua Dr. Vila Nova, 245.
Telefone: 3234-3000-2281.
Data: Até 13 de março.
Horário: Sexta e sábado, às 21h e domingo às 19h.
Preço: R$ 25,00.